quinta-feira, 29 de dezembro de 2011

A Bem-Aventurança II




Duas coisas importantes: Há apenas uma Bem-aventurança com múltiplas facetas; o pobre de espírito, o manso, é o mesmo que tem sede e fome de justiça, de tal forma que esses atributos atuam uns sobre os outros, ou são atributos de uma mesma virtude – a mansidão não é debilidade nem ingenuidade, pois tem fome de justiça; conhece muito bem o estado de coisas, diagnostica o presente, sabe da organização desgraçada que alguns estão impondo ao mundo, e arriscam a vida anunciando a paz, a paz que não existe sem justiça. Dizer, bem-aventurados os pobres de espírito não é um louvor a subjetividade miserável produzida em série em nossa contemporaneidade, pois o pobre de espírito tem uma argúcia e uma coragem de profeta, um desejo infinito de justiça, uma audácia de anunciar o Novo.

Segunda coisa: Essa Bem-aventurança é sempre coletiva. É preciso ver que Jesus está sempre apelando a uma coletividade por vir, e não ao indivíduo. Quando tudo é entendido como apelo a uma santidade pessoal, individual, descambamos no moralismo religioso burguês, e matamos parte da radicalidade do apelo. Jesus está apelando aos seus discípulos, uma comunidade por vir, que terá uma atmosfera e uma potência sinérgica, ou seja, o conjunto será infinitamente maior que a soma das partes. Jesus está falando a um corpo, o que não significa que seja uma organização da coletividade – tal como uma “Igreja”, que só é possível às custas do estrangulamento das singularidades dos indivíduos. A comunidade de Cristo quer a intensificação da diferença de cada um para o enriquecimento dela, visto ser “acéfala”, sem cabeça, ou seja, sem hierarquização e organização fixa – já que só há um Cabeça, Cristo. Essa Bem-aventurança só é possível em uma coletividade, só uma coletividade exerce o efeito de Luz e Sal do mundo. Deve-se entender aquele ódio e perseguição que os Bem-aventurados sofrem como uma vingança política e social ao que poderíamos chamar de um “movimento social”; a perseguição que os primeiros discípulos sofreram foi a vingança das instituições governantes a um movimento social subversivo, que ameaçava a organização social, as verdades, as crenças. Ou seja, o discipulado de Jesus tem implicações profundas, uma coragem para viver coletivamente a sede de justiça; relações regidas pela justiça e pela paz. O anúncio da paz também será as silenciosas relações dessa coletividade sedenta de justiça. É arriscado ser discípulo de Jesus! Não poderá deixar de suscitar uma reação política e social, da família, dos religiosos, dos políticos – talvez violenta!

Mas, como viver essa Bem-aventurança hoje? Temos vivido essa Bem-aventurança?

Al Duarte

dezembro de 2011

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